sábado, 9 de janeiro de 2016

Quebra Canela

Raul da Cruz Lima Junior

Sinopse elaborada por Carlos Evando dos Santos
15 Jul 2013

O livro Quebra-Canela discorre sobre os trabalhos desenvolvidos pela 2ª Companhia de Engenharia de Combate (2ª Cia E Cmb), orgânica do 9º Batalhão de Engenharia de Combate (9º BE Cmb), integrante da Força Expedicionária Brasileira (FEB), que atuou no Teatro de Operações (TO) da Itália durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
O autor, o General Raul da Cruz Lima Junior, que, como capitão, comandou a 2ª Cia do 9º BE Cmb durante toda a campanha, registra, com simplicidade e calor humano, os principais episódios da guerra vividos por ele e seus subordinados no cumprimento das árduas e nobres missões da Arma de Engenharia nos campos de batalha da Europa.
O título da obra – Quebra-Canela – faz referência a um episódio marcante ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial. Na tarde do dia 14 de abril de 1945, o Pelotão do Tenente de Infantaria Iporan penetrou com tanto ímpeto na cidadela de Montese, que surpreendeu o inimigo nos postos de observação. Em apoio ao Pelotão do Tenente Iporan, estava o 6º Pelotão de Engenharia, comandado pelo Tenente de Engenharia Vinhaes, que acompanhou a Arma-Base desde a Linha de Partida (LP), removendo obstáculos e abrindo brechas nos campos de minas.
Na manhã do dia 15 de abril de 1945, o Tenente Vinhaes recebeu um pedido urgente de socorro vindo de um grupo que havia caído em área minada. Os bravos engenheiros levaram algum tempo para abrir uma brecha através das minas até alcançar os feridos.
Ao chegar ao local, o Pelotão de Engenharia deparou-se com um quadro assustador: rostos deformados e sujos de lama; no lugar dos pés dos combatentes restava, apenas, uma mancha de sangue. Era o trágico resultado da ação mutiladora de um inimigo invisível – a mina antipessoal, de tal forma disseminada no terreno que dispensava a presença do inimigo em largas faixas de defesa.
A mina schuchmine era um pequeno invólucro de madeira, não maior que uma caixa de charutos, que, sob a pressão do pé do combatente, detonava uma carga de explosivos suficiente para arrancar-lhe o pé e atingi-lo até o terço inferior da perna.
A tropa brasileira, que, para tudo, tinha um apelido, deu à schuchmine o batismo pitoresco de “quebra-canela”. A presença dessa mina não era denunciada pelo detector eletrônico de metais, pois o invólucro do artefato explosivo era de madeira.
A neutralização da schuchmine era realizada unicamente pela sondagem com o bastão, arriscada missão executada heroicamente pela Arma de Engenharia na Campanha da Itália.
No Capítulo 1 (introdutório), o autor, em suas “primeiras palavras”, nos relata a motivação que o levou a escrever o livro, motivação essa nascida numa tarde melancólica, a partir do assalto de lembranças do front italiano na Segunda Guerra Mundial. As imagens recordadas eram tão nítidas que o autor se achou capaz de rememorar os feitos memoráveis dos cento e oitenta homens simples, despretensiosos e anônimos que constituíram a 2ª Cia do 9º BE.
Na sequência, no Capítulo 2, descreve a trajetória do 9º BE do Rio de Janeiro – Aquidauana – Três Rios – Rio de Janeiro. Criado pelo Decreto-Lei nº 4.799, de 06 de outubro de 1942, o 9º BE foi organizado na capital fluminense, a partir do Batalhão Villagran Cabrita, situado na Vila Militar. O autor, recém-promovido ao posto de capitão, foi, então, transferido do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro/RJ (CPOR/RJ) para a nova Organização Militar de Engenharia, que se preparava para iniciar o deslocamento para a sua nova sede: a pacata cidadela de Aquidauana-MS. Pela Portaria Ministerial nº 47/1944, de 9 de agosto de 1943, o 9º BE foi designado para compor a 1ª Divisão de Infantaria Expedicionária (1ª DIE). O Batalhão, recém-chegado a Aquidauana, iniciou, então, sua preparação para a guerra com dificuldades de toda ordem: tropa indisciplinada, recém-incorporada e organizada, falta de meios etc. Algumas instruções foram improvisadas, como a de desminagem, conduzida com latas velhas enterradas simulando campos de minas. O 9º BE era uma tropa hipomóvel, o que ia de encontro aos padrões do Exército dos Estados Unidos da América (EUA), que já se encontrava no front, ao lado de quem os brasileiros iriam combater. Chegada a ordem para partir, o 9º BE iniciou longo e penoso deslocamento às suas origens: a Vila Militar no Rio de Janeiro, onde ocorreriam os preparativos finais do embarque para a Europa. Em 20 de setembro de 1944, a 2ª Cia partiu juntamente com o 2º Escalão da FEB no navio transporte de tropas General Mann rumo ao continente europeu.
No prosseguimento, é descritaA Grande Travessia” (Capítulo 3). O 2º Escalão da FEB, a comando do General Cordeiro de Farias, Comandante da Artilharia Divisionária da 1ª DIE, partiu rumo ao TO da Itália. Ao todo: cinco mil e setenta e cinco homens, somado aí o efetivo da 2ª Cia do 9º BE. O grande efetivo foi distribuído em grandes compartimentos do navio, cada um com cerca de quatrocentos e cinquenta homens. A viagem foi permeada por exercícios constantes de alarme e abandono do navio, a qualquer hora do dia ou da noite. A vida havia se tornado enjoada e enfadonha. No dia 12 de outubro de 1944, ocorreu o desembarque do 2º Escalão da FEB no Porto de Livorno, totalmente devastado pelos alemães. A cobra estava prestes a fumar!
Em seguida, o autor nos presenteia com os relatos do treinamento final, do front, das primeiras peripécias e do batismo de sangue da 2ª Cia do 9º BE. O rigoroso treinamento militar final ocorreu nas proximidades da cidade de Pisa, onde foram submetidos a testes usuais e provados em ação de conjunto, até ficarem em condições de serem designados para algum front. Foram ministradas instruções de desminagem, cursos de pontes e treinamento táticos de emprego da tropa. O front designado: o Vale do Rio Reno. A primeira missão de guerra foi apoiar o deslocamento do 1º Esquadrão de Reconhecimento (1º Esqd Rec) para a localidade de Gaggio Montano, pois a estrada que ligava Silla àquela cidade estava parcialmente minada. Tentada a remoção das minas ainda durante o dia, a Seção do Tenente Edson foi rechaçada da posição a tiros de metralhadoras inimigas, por sorte sem nenhum ferido da parte brasileira. A retirada das minas só poderia ser feita à noite, com a segurança feita pela própria Engenharia, com total sucesso. O Esqd Rec do Cap Pitalluga prosseguiu no cumprimento de sua missão.
No Capítulo 5, relata o apoio de Engenharia aos ataques sucessivos a Monte Castelo, a grande epopeia da FEB na Campanha da Itália. A 2ª Cia do 9º BE fez-se presente em todos os ataques realizados a essa posição chave da defesa alemã. Desde o ataque de 24 de novembro de 1944, quando a tropa brasileira era apenas um reforço a Task Force 45 até o ataque final de 21 de fevereiro de 1945. Realizou diversas missões de combate, desde conservação, manutenção e melhoramentos da rede de estradas, reconhecimentos, abertura de brechas nos campos de minas alemães, construção de postos de observações para os comandantes dos ataques etc.
Posteriormente, no Capítulo 6, descreveO inverno – Fase de Estabilização das Operações”, na qual houve uma trégua entre os contendores, imposta pelas condições meteorológicas. Os soldados brasileiros passaram a se encantar com o branco da neve que a tudo encobria. As principais atividades desenvolvidas foram de caráter defensivo, com o lançamento de campos de minas e preparação de destruições de pontes, tudo com vistas a proteger as nossas tropas de possíveis ataques alemães. Patrulhas de infantaria brasileiras, reforçadas por elementos de engenharia, de quando em quando, eram lançadas com vistas a reconhecer atividades inimigas nas proximidades. Os oficiais brasileiros, inclusive o autor, foram contemplados, mediante rodízio, com quatro dias de descanso em cidades importantes, como Roma e Florença. Coisas inimagináveis, até então, para um período de guerra.
Na sequência,A conquista de Monte Castelo – Preparativos para a grande Ofensiva” (Capítulo 7). Monte Castelo, agora, seria atacado pela 10ª Divisão de Montanha, americana, e pela Divisão de Infantaria Expedicionária brasileira. À DIE caberia: conquistar Monte Castelo, limpar o Vale do Rio Marano e conquistar Castelnuovo. O 1º Regimento de Infantaria (RI) – Regimento Sampaio – realizando o ataque principal, conquistaria Monte Castelo. O 2º Batalhão do 11º RI, apoiado pela 2ª Cia do 9º BE, com progressão limitada, cobriria o flanco direito do Regimento Sampaio. As jornadas de 19 a 21 de fevereiro de 1945 foram vitoriosas, inclusive para o 9º BE, que, pela primeira vez, fora empenhado, em sua totalidade nos ataques ao Monte Castelo, contando inclusive com reforços da engenharia americana para poder atender aos múltiplos encargos de ordem tática e técnica.
Dois episódios merecem destaques. Primeiro: “durante o ataque do Regimento Sampaio, o Batalhão do Major Ramagem ficou detido face a um campo de minas alemão. Deitados no terreno, o Cel Machado Lopes e o Cap Raul, encobertos por pequena elevação, o Cmt 9º BE dá ordem ao Cmt da 2ª Cia: “Ultrapasse a Infantaria do Btl Major Ramagem e retire as minas que o detêm!” O Cmt da 2ª Cia, nervoso, responde: “É uma ordem suicida, mas vou cumpri-la”. Sob a proteção dos fogos do próprio Batalhão, com algumas baixas da Companhia, as minas foram retiradas; o ataque prosseguiu e entraram, vitoriosos, em Santa Maria Vigliana – Rocca Pittigliana”I. Segundo: “o Gen Mascarenhas de Moraes, acompanhando de seu PO os ataques, recebeu mensagem telefônica relatando dificuldades causadas por minas e que a engenharia não havia aberto ainda as brechas nos campos de minas alemães. Imediatamente, o Gen Mascarenhas mandou chamar o Cap Raul e, sem maiores rodeios, ordenou-lhe à queima-roupa: “Precisamos avançar e as minas ainda não foram retiradas”. O Cap Raul começou a explicar a situação, quando o Gen atalhou, encerrando o assunto: “Vá resolver o caso pessoalmente”. O que foi prontamente cumprido. Com o empenho pessoal do Cap Raul, as brechas foram abertas e os ataques prosseguiram”.
Posteriormente, é narrado o “Fim das Operações Preliminares do IV Corpo-de-Exército – Conquista de Castelnuovo” (Capítulo 8). A 5 de março de 1945, o 1º Batalhão do 6º RI deveria atacar Castelnuovo, apoiado pela 2ª Cia do 9º BE. Não haveria tempo para reconhecimentos e a região era totalmente desconhecida. O Capitão Raul, já tendo incorporado ensinamentos colhidos dos combates anteriores, deu início a um estudo minucioso de emprego da sua engenharia, particularmente quanto à abertura de passagens nos campos de minas inimigos (dosagem de brechas e de trilhas por Batalhão de Infantaria).
Em seguida, a “Ofensiva da Primavera – Conquista de Montese” (Capítulo IX), a última grande batalha. A 1ª DIE atacaria, na jornada de 14 de abril de 1945, empregando em 1º escalão, o 11º RI e o 2º/1º RI, ficando o 6º RI e o Esqd Rec em reserva. A missão da Engenharia era manter em estado de tráfego as estradas e fazer o acompanhamento do 11º RI nas operações sobre Montello-Montese-747 e do Esqd Rec no Aproveitamento do Êxito sobre o Rio Panaro. Coube à 2ª Cia do 9º BE fazer o acompanhamento do 11º RI. Durante essa fase da campanha, as Seções de Engenharia passaram a denominar-se Pelotões de Engenharia (Pel E). Cada Pel E apoiaria o ataque de um BI (dosagem básica adotada até os dias atuais). A epopeia da Tomada de Montese encontra-se relatada na parte inicial desta Sinopse.
No Capítulo 10, é relatada a satisfação da tropa brasileira em presenciar aPerseguição e a rendição alemã na Itália”. Assim como os bravos infantes, o 9º BE testemunhara o fim da guerra.
No Capítulo 11 A ocupação militar – Concentração em Francolise – Regresso à Pátria – Desmobilização”, o General Raul relata o recebimento, pelas tropas brasileiras, da notícia auspiciosa: foi, assinada, em 8 de maio de 1945, em Berlim, na Alemanha, a rendição incondicional de todas as forças alemãs. Era o fim. Mas uma última missão restava à 2ª Cia: lançar uma Ponte Bailey sobre o Rio Tidone, em substituição a uma ponte destruída pelos alemães em sua retirada. No dia 25 de julho de 1945, o 9º BE embarcou a bordo do navio brasileiro Pedro II com destino ao Brasil. Em 13 de agosto de 1945, os Heróis da Pátria reviram o Pão-de-Açúcar.
No Capítulo 12, asConsiderações Finais”.
A obra Quebra-Canela, do General Raul da Cruz Lima Junior, é um livro recomendado para todos, civis e militares e, por que não, obrigatória para todas as gerações de engenheiros.
Escrita com a simplicidade de um soldado, com a imparcialidade de um comandante que deseja transmitir valiosos conhecimentos de combate, e com o intuito de não deixar perderem-se no tempo e no espaço os momentos gloriosos vividos pelos militares do 9º BE no maior conflito de todos os tempos, deve ser encarada como uma grande referência da nossa História Militar.

O exemplo de vida do "Capitão Raul", pessoal e profissional, constitui-se em revigorado incentivo às atuais gerações de engenheiros.


Referência:

Lima Jr, Raul da Cruz. Quebra Canela. A Engenharia Brasileira na Campanha da Itália. 2 ed. Rio de Janeiro: Bibliex, 1982.


3 comentários:

  1. Muito obrigado pelo texto, esclarecedor! Aos esforços de guerra desses heróis brasileiros minha eterna gratidão, embora passados tantos anos com certeza ão de estar ao lado dos justos por tão importante missão! Obrigado.

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  2. Maravilhoso. Fui lendo e imaginando as cenas.

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  3. Uma história de heroísmo e bravura que todos os brasileiros deveriam conhecer e se orgulhar!

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