sexta-feira, 23 de março de 2018

Simón Bolívar, El Libertador


Um dos maiores vultos da história latino-americana, de temperamento idealista e exaltado, comandou o vendaval de liberdade que promoveu a independência da Venezuela, Colômbia, Peru e Bolívia. 

Carlos Evando dos Santos
23 Mar 2018

Simón José Antonio de la Santísima Trinidad Bolívar Ponte-Andrade y Blanco era filho do coronel Juan Vicente Bolívar, descendente da rica aristocracia espanhola, que chegou à Venezuela em 1588. Aos nove anos, já órfão de ambos os pais, restou adotado por um tio, Carlos Palácios, que entregou sua educação a um tutor, Simón Rodríguez. 

Bolívar foi um leitor de voracidade imperturbável, tanto nas tréguas das batalhas como nos repousos do amor, apesar da falta de ordem e de método. A vida de guerra o obrigou a deixar um rastro de mais de quatrocentas léguas de livros e papéis, da Bolívia à Venezuela. Apesar do desfiladeiro de livros, jamais leu tantos quantos possuía. 

Desde os vinte anos, não houve na vida de Simón Bolívar um momento que não fosse decisivo. Estrategista de grande precisão, movias exércitos inteiros como peças de xadrez, antecipando-se aos propósitos mais secretos de seus inimigos. Detentor de inspiração admirável, era capaz de conceber uma situação completa até os últimos detalhes. Com uma memória visual surpreendente, previa obstáculos muitos anos antes. 

No entanto, apesar das notórias qualidades, o grande líder militar não foi capaz de vencer as intrigas políticas e ambições regionalistas que acabaram por minar o seu empenho na consolidação de seu sonho unificador de uma grande pátria, desde o México até a Terra do Fogo. A imprensa da época, instigada por seu principal inimigo, o general colombiano Francisco de Paula Santander, não desperdiçava nenhuma oportunidade para atribuir muitos dos seus fracassos às suas urgências com as mulheres.

1783. Simón Bolívar nasce em Caracas, Venezuela, em 24 de julho de 1783, no seio de uma família da aristocracia colonial.
1786. Aos três anos perde o pai, o coronel Juan Vicente Bolívar.
1792. Aos nove anos, perde a mãe, María de la Concepción Palácios y Blanco, passando a ser tutoreado por um tio, Carlos Palácios e educado sob os cuidados de Simón Carreño Rodríguez, pedagogo revolucionário, que lhe infunde o amor à liberdade e lhe dá a conhecer obras filosóficas greco-romanas e iluministas.
1799. Bolívar viaja para a Espanha, fazendo escalas no México e em Cuba. Em Veracruz escreve sua primeira carta.
1800. Em Madri, entra em contato com o sábio Marquês de Ustáriz, seu verdadeiro forjador intelectual.
1802. Casa-se com María Tereza Rodríguez del Toro y Alayza, em Madri.
1803. María Tereza morre de febre amarela. Bolívar jura não mais se casar.
1804. Viaja para a Europa, onde tem a oportunidade de assistir à coroação de Napoleão Bonaparte, por quem perde o respeito, pois segundo ele, o grande general havia traído os ideais revolucionários e republicanos. Aproxima-se das doutrinas de Rousseau, Montesquieu e Voltaire e conhece o polivalente cientista alemão Alexander von Humboldt. Após breve visita aos EUA, regressa à Venezuela em 1806 e se converte no principal dirigente da luta pela independência das colônias hispano-americanas.
1807. Iniciado o Movimento pela Emancipação da América Espanhola, Bolívar entra para as Juntas de Resistência Venezuelanas, com 24 anos de idade.
1810. Bolívar é enviado para a Inglaterra em missão diplomática, onde conhece Francisco de Miranda.
1811. Em 5 de julho, um Congresso recém-formado proclama a Independência da Venezuela. A 23, Bolívar participa dos combates sob as ordens de Francisco de Miranda, em Valencia. É a sua primeira experiência de guerra.
1812. Traído por um oficial, as forças espanholas prendem Francisco de Miranda, que se refugia em Caracas, onde consegue um salvo-conduto para Curaçao. Bolívar escreve o famoso "Manifesto de Cartagena", no qual prega a união dos revolucionários, condena as debilidades do federalismo e pede o fim do poder espanhol na Venezuela.
1813. Após assumir o Movimento pela Independência da Venezuela, é proclamado El Libertador.
1815. O governo republicano de Cartagena encarrega Bolívar de comandar uma expedição militar à Venezuela. O clero e setores das classes mais baixas da população índia e mestiça derrubam o governo republicano e obrigam Bolívar a se refugiar na Jamaica, onde redige a famosa “Carta da Jamaica”, reafirmando sua confiança na emancipação dos povos americanos, apesar de seu revés crítico. “Não foram os espanhóis, mas nossa própria desunião o que nos levou de novo à escravidão”.
1816. Após nova tentativa de emancipação, com o apoio material do presidente do Haiti, Alexandre Pétion, é derrotado novamente, refugiando-se na ilha caribenha. Nova campanha libertadora é iniciada pela região do Orenoco, desta vez com o apoio dos llaneros, guerrilheiros sob o comando de José Antonio Páez, e milhares de legionários europeus são enviados em seu auxílio.
1817. Após a Batalha de San Félix, Angostura é libertada e obtido o domínio sobre a bacia do rio Orinoco. Bolívar adota um discurso conciliatório.
1818. Bolívar derrota o general espanhol Pablo Montillo em Calabozo e funda, em Angostura, o jornal Correo del Orinoco.
1819. Reunido em Angostura com os deputados das províncias venezuelanas, Bolívar expôs seu plano político, depois de converter a cidade em sede do governo e capital da república. Apresenta um projeto de constituição onde propõe a criação de “um grande estado”, mediante a união da Venezuela, Nova Granada (atual Colômbia) e Quito (hoje Equador), sob o nome de Gran Colombia. O Congresso de Angostura aprova a criação da República da Colômbia (Venezuela, Cundinamarca e Quito), da qual “O Libertador” é eleito presidente. Bolívar obtém sucessivas vitórias, atravessa os Andes, triunfa decisivamente em Boyacá e consolida Bogotá.
1820. Bolívar firma o armistício de seis meses, em Sant’Anna, com o general espanhol Pablo Morillo.
1821. As hostilidades recomeçam, mas os espanhóis são derrotados definitivamente na Batalha de Carabobo, o que põe fim ao domínio espanhol na Venezuela. O Congresso promulga a constituição definitiva da Colômbia e ratifica a Presidência de Bolívar.
1822. Depois das Batalhas de Bomboná e Pichincha, Quito capitula e o território equatoriano é integrado ao da República da Colômbia. Bolívar e o general José de San Martín reunem-se em Guayaquil, para decidir o destino do Peru, onde ainda havia tropas espanholas. O seu ponto de vista prevalece e o chefe argentino renuncia a qualquer pretensão sobre o Peru.
1823. Bolívar envia seis mil homens para a guerra civil no Peru. Após autorização do congresso peruano, Bolívar submete Riva Aguero, acusado de promover uma sublevação em favor dos espanhóis.
1824. Bolívar decreta pena capital para aqueles que praticarem atos de corrupção contra o tesouro público. O general é nomeado ditador pelo Congresso do Peru para salvar a república em ruínas. As vitórias em Junín e Ayacucho, esta última comandada por Antonio José Sucre, terminam definitivamente com o poderio espanhol no continente sul-americano. Bolívar convoca o Congresso do Panamá, a primeira conferência hemisférica, último sonho de Bolívar, para promover a união das repúblicas hispano-americanas.
1825. A Inglaterra reconhece a independência das novas nações americanas. O Congresso do Peru decreta honras a Bolívar e aprova a criação da República da Bolívia.
1826. “O Libertador” atinge o ponto culminante de seu poder: Presidente da Colômbia, Chefe Supremo do Peru e Presidente da Bolívia. Entretanto, as aspirações regionalistas não tardam em promover a desagregação da grande nação idealizada e, progressivamente, a situação torna-se insustentável. Bolívar confirma Páez como primeiro mandatário da Venezuela.
1827. O Congresso da Colômbia rejeita a renúncia de Bolívar e exige que ele assuma a presidência. Em 10 de setembro, Bolívar presta juramento como presidente da república, enfrentando forte oposição política.
1828. Bolívar sofre um atentado, em Bogotá, conhecido como "Conspiração Setembrina", da qual sai ileso graças à ajuda de Manuela Sáenz. O general é obrigado a renunciar à presidência vitalícia do Peru.
1829. Com a Guerra Civil de 1829, a Venezuela e a Colômbia se separam; o Peru abole a Constituição Bolivariana; e a Província de Quito torna-se independente, adotando o nome de Equador.
1830. Sucre é assassinado em Berruecos. Urdaneta assume a presidência da Colômbia. Ressentido, acuado e tuberculoso, El Libertador morre em Santa Marta, Colômbia, em 17 de dezembro de 1830, aos 47 anos, cercado por poucos amigos.

O general de pernas encurvadas que cavalgou dezoito mil léguas, mais de duas vezes a volta ao mundo, morreu amargurado, acreditando que a gente das quatro nações que libertou não gostava dele. Procurava ver-se no espelho o menos possível para não topar com os próprios olhos. Buscava uma forma de purificação do corpo e da alma dos vinte anos de guerras que, no fim, julgou inúteis. 

Simón Bolívar morreu desenganado com o poder, sem o consolo da gratidão pública, em meio a crises de demência. El Libertador não teve filhos.


Referência:

García Márquez, Gabriel. O general em seu labirinto. Tradução de Moacir Werneck de Castro. 8 Ed. Rio de Janeiro: Record, 2005.



quinta-feira, 22 de março de 2018

Água: a crise anunciada

O Estado de S. Paulo (Editorial) 
22 Mar 2018


O Dia Mundial da Água, comemorado hoje, foi instituído durante a 2ª Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente (Eco-92), realizada no Rio de Janeiro, em julho de 1992. Vinte e cinco anos depois, o Brasil recebe representantes de 160 países, entre eles 12 Chefes de Estado, reunidos em Brasília, desde domingo, para tratar do tema no 8º Fórum Mundial. 

Cerca de 30% dos 7,6 bilhões de habitantes do planeta não têm acesso à água potável e mais de 50% não são atendidos por serviços de sanamento básico. Entre 1990 e 2015, aumentou de 76% para 91% a parcela da população global atentida por fonte de água potável. Mas pelo menos 2,5 bilhões de pessoas do planeta não têm acesso a serviços de saneamento nem sequer a banheiros ou latrinas, revela estudo da Organização das Nações Unidas (ONU). Entre os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, definidos pela organização, o sexto prevê, até 2030, "assegurar a disponibilidade e gestão sustentável da água e saneamento para todas e todos". 

Vários fatores contribuem para esse cenário global. A situação é agravada pela falta de planejamento na expansão das áreas urbanas, do desmatamento, da má gestão dos resíduos sólidos, do lançamento de efluentes nos corpos hídricos e do desperdício por mau gerenciamento das redes de distribuição. 

Embora seja considerada essencial à vida e haja consciência de que é um recurso finito, a água não tem merecido políticas públicas adequadas à sua preservação e produção. No Brasil, 917 municípios convivem com a seca. A crise hídrica é realidade para 16% das cidades, entre elas a capital da República, que, há quase dois anos, vive em sistema de racionamento. 

Exceto, os municípios do semiárido nordestino, que padecem os efeitos de fenômenos climáticos, no restante das grandes cidades, a dificuldade de abastecimento de água tem estreita relação com a má gestão. Vazamentos nos dutos, por falta de manutenção, e fraudes que correspondem a quase 40% do desperdício de água no país. Entre os 5.570 municípios, 4.490 (81%) despejam pelo menos 50% do esgoto produzido diretamente nos cursos d'água, sem qualquer tratamento, segundo o Atlas Esgotos - Despoluição da Bacias Hidrográficas, divulgado, em setembro do ano passado, pela Agência Nacional de Águas (ANA). 

O argumento de praxe dos gestores públicos é a falta de recursos financeiros para implantar as usinas de tratamento de efluentes e os aterros sanitários. A ausência de definição do que é prioritário para a saúde e a vida das pessoas está, na maioria das vezes, na raiz das crises na saúde e na economia. 

Na primeira Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, há 45 anos, ambientalistas e especialistas alertavam para a finitude da oferta de água e para a crise que o planeta enfrentaria caso não revisse o seu modelo de uso e consumo. A advertência do passado se transformou em realidade.

Hoje, a escassez do recurso está entre uma das principais causas dos movimentos migratórios em todo o globo, com graves impactos sociais e econômicos. A questão é uma das mais debatidas no 8º Fórum Mundial da Água, que se encerra amanhã. Garantir água para todos, como objetiva a ONU, passa não só pela revisão de prioridades das políticas públicas, mas sobretudo pela educação, para que as pessoas tenham consciência, evitem o desperdício, a poluição e a destruição dos recursos naturais. 

O Sermão da Montanha

Jesus Cristo, segundo o Evangelho de Mateus Mateus 5 1 Vendo as multidões, Jesus subiu ao monte e se assentou. Seus discípulos aproxi...